As moedas falsas

As moedas falsas


O povo conta, por aí, que um comerciante  tinha uma loja numa rua bem frequentada. Muitas pessoas entravam no estabelecimento e compravam alguma mercadoria. O homem ficava sentado no caixa e colocava em diferentes compartimentos as moedas e as notas de papel conforme o valor. Um amigo, parou bem perto dele para conversar e reparou que o comerciante tinha outra pequena repartição na gaveta onde colocava moedas falsas ou o dinheiro antigo, já fora de uso. Contudo ele agradecia o cliente com um sorriso e não falava nada. 

– Você pegou moedas falsas sem dizer nada? Perguntou o amigo. O comerciante respondeu com um sorriso meio triste:

 - Veja bem, quando acontece isso, penso sempre: eu também sou uma moeda sem valor, mas Deus me aceita sem reclamar!


No evangelho do Segundo Domingo de Advento, deste ano, encontramos o “mensageiro” que vai à frente do Senhor, João Batista, aquele que se define: “a voz que grita no deserto” (Mc 1, 3). João é uma pessoa austera, convida a um “batismo de conversão”. Ele mesmo vive afastado do barulho da cidade, com simplicidade na comida e na roupa. Dessa maneira, não só a pregação, mas a própria pessoa dele se torna um sinal que chama atenção. Como outros profetas e pregadores anteriores, João anuncia alguém mais importante do que ele, alguém que batizará não só com a água, mas também “com o Espírito Santo”: o Messias esperado. Mais um motivo para alimentar a expectativa, convocar as multidões e reforçar o convite a uma mudança de vida.
Por isso, o tempo litúrgico do Advento é, para nós também, um tempo de “conversão”.

 Nunca é fácil dar uma virada ao rumo da nossa vida, mas talvez seja esse um desejo escondido para o qual sobram convites, mas nos falta coragem. No tempo de Advento, essa “conversão, tem o gosto da abertura, da acolhida de Alguém que precisamos deixar entrar em nossa vida. Ele, o Senhor, já veio no meio de nós e sempre vai chegar para quem lhe preparar o caminho. O que falta para que isso aconteça?


De novo, João Batista pode nos ajudar. A primeira condição, talvez, seja o ambiente do “deserto” entendido como momentos de bendita solidão e não, com certeza, de isolamento. “Deserto” não é fuga, escondimento. Deserto é a capacidade de silenciar as confusões ao nosso redor, para poder escutar a voz da nossa consciência, a voz de Deus e a voz dos pobres. Penso, sim, nessa ordem, porque cabe a nós pedir a Deus o dom da escuta. De outra forma, o Natal de Jesus será uma mera repetição de costumes e de emoções exteriores. Igualmente não saberemos ouvir a voz dos pobres se, em nossa vida, prevalecem o nosso comodismo e bem-estar e praticamos uma religiosidade só intimista e interesseira. A segunda condição para o começo da nossa conversão é o reconhecimento da nossa fragilidade e carência. João Batista falava de alguém “mais forte” e reconhecia a sua indignidade. Se estamos cheios de orgulho e nunca admitimos ter errado e que sempre podemos errar, dificilmente, alguma vez, pediremos desculpa. Por consequência, nunca mudaremos nada da nossa maneira de nos relacionar com os outros. Entraremos em disputas e apontaremos sempre os defeitos alheios. 

Numa sociedade cheia de super-heróis que se autopromovem, a humildade fica esquecida. Então, quem consegue perseverar no caminho da conversão? A boa notícia é que não estamos sozinhos. O Menino que acolheremos no Natal será chamado Jesus, mas também Emanuel, Deus conosco (Mt 1,23). Jesus, bem sabemos, não veio para os que se acham tão bons de não precisar de nada, veio para os que se reconhecem pecadores, necessitados de conversão. O Senhor gostaria de não perder nenhum dos seus filhos e filhas, porque para ele somos todos muito preciosos. O amor dele quer chegar aos últimos e aos mais afastados. Nasceu pequeno para que não esqueçamos os menores, os menos considerados, os invisíveis. Para ele,
 não tem moedas falsas que possam ser jogadas fora. No coração dele, tem lugar para todos e todas. Também para nós, se quizermos.         



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